O mundo dos negócios tem passado por grandes mudanças nas últimas décadas e, sobretudo, nos últimos anos, certamente em razão de uma maior fiscalização de órgãos reguladores estatais, mas sobretudo, em razão de uma cultura cada vez mais voltada a atribuição de responsabilidade no desenvolvimento de uma sociedade mais plural, ética e integra.
Essa dinâmica tem como pano de fundo a demanda por mais transparência e a necessidade de ocupar espaços que poderiam ser infestados por práticas ilegais ou mesmo que, a despeito de não criminosas, eticamente questionáveis. Episódios históricos revelam ainda a necessidade de estabalecimento de regras para evitar danos que ultrapassam as salas dos empresários e invadem as casas dos cidadãos.
Some-se a esse cenário a globalização como fator de aceleração nas relações internacionais entre empresas e governos e, sobretudo, o aumento exponencial na transferência de divisas, cujo controle passa a ser cada vez mais estreitado, em razão na necessidade de evitar o seu escoamento para o financiamento de crimes, governos déspostas, guerrilheiros, terroristas ou para o deleite daqueles que obtem recursos por meio de práticas ilegais.
A publicização de escandalos de corrupção (incluive entre entes privados, o que no Brasil não é crime – ainda), desvio de recursos e o reconhecimento do poderio empresarial que muitas vezes ultrapasa o de estados (aqui no sentido de países) acentua a preocupação de criar mecanismos de controle preventido, regras de intregridade, para funcionar como limitadores e filtros.
Já as empresas passam também a enxergar a necessidade de não apenas seguirem a lei mas de efetivamente criarem mecanismos internos capazes de estabelecer uma nova cultura onde há responsabilidade social, mas sobretudo filtros que permitam detectar desvios de seus colaboradores, prevendo medidas a serem adotadas, o que de outro lado poderá impactar na sua eventual responsabilização, na hipótese dos danos causados extrapolarem os limites de interesse da sua esfera interna.
É justamente nesse contexto que entra o já afamado compliance. Com esse pequeno blogpost, vou trazer conceitos básicos para aqueles não familiarizados com o tema. Espero que você goste.
O que é compliance?
Antes de qualquer esclarecimento adicional, convém conceituarmos o termo “compliance”. Essa é uma palavra que se origina da língua inglesa, derivada da expressão “to comply”, que em português é traduzida como “agir em conformidade com regras e procedimentos”.
De maneira simples, compliance nada mais é do que prezar pelo cumprimento das regras, normas e disposições internas e externas no que se refere à atuação empresarial. É, portanto, o agir empresarial pautado na ética, na boa-fé e no estrito cumprimento das leis e regulamentações impostas às atividades que a empresa desempenha.
Mas não é só. O compliance também tem como orientação a prevenção, educação, mas sobretudo a adoção de procedimentos estruturados de investigação para solucionar a violação desse conjunto de disciplinas e regras (internas e externas).
Vale ainda destacar que as regras que compõem o compliance são leis de diferentes níveis (federal, estadual, municipal) e das mais distintas áreas, como trabalhista, ambiental, contábil, tributária, penal etc., que determinam condutas a serem observadas pela empresa, bem como procedimentos a serem adotados no exercícios de suas atividades.
Além das regras legais, há ainda os regulamentos internos que devem tratar dos princípios da organização, seus valores e missão, mas sobretudo estabelecer e construir instrumentos como códigos de ética, política interna, que podem ser parte integrante de um programa completo de compliance, onde devem constar não apenas os procedimentos e regras que são mandatórios em razão da legislação, mas aqueles relacionados com a cultura da empresa em contribuir com um ambiente mais ético e colaborativo, no sentido de adotar condutas transparentes e eficazes para previnir, investigar, responsabilizar e banir condutas ilegais, antiéticas ou simplesmente contrárias àquelas que guiam o negócio.
Mas atenção: não basta ter um calhamaço de papel. É preciso implementar e manter o programa de compliance de forma ativa, efetiva, para que faça parte do dia-adia das pessoas e seja integrado ao seu DNA.
Qual é a origem desse termo?
O ideal de compliance surge nos Estados Unidos, no início do século XX, período em que as agências reguladoras começaram a se tornar mais comuns. Inicialmente, em 1906, as lideranças norte-americanas criaram um método de fiscalização centralizado, na tentativa de regular atividades relacionadas à saúde alimentar e à comercialização de medicamentos.
Contudo, foi em razão das instituições financeiras que o compliance se disseminou. Em 1913, com a criação do Federal Reserve System (Banco Central dos Estados Unidos), buscou-se estabilizar o sistema financeiro, mantendo-o mais seguro e adequado às leis. Outro marco importante foi a criação da SEC – Securities and Exchange Comission, com a exigência de registro e do prospecto de emissão de títulos e valores mobiliários.
A criação do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD) em 1945 também são marcos importantes, já que tinham como objetivo básico zelar pela estabilidade do sistema monetário internacional e oferecer empréstimos a países em desenvolvimento de renda média, respectivamente.
Já em 1960 a SEC passa a insisitr na contratação de compliance officers para diversas atividades, como criar procedimentos internos de controle e treinar pessoas.
O ano de 1974 é marcado pelo escândalo do caso Watergate, revelando que ainda havia fragilidade no sistema de controle. Foi nesse ano que ocorreu a criação do Comitê da Basiléia para Supervisão Bancária, com a missão de fortalecer a solidez dos sistemas financeiros.
Outro marco importante foi a promulgação o FCPA (Foreign Corrupt Practices Act), em 1977. Essa era a lei anticorrupção transnacional norte-americana, que obrigava as empresas a manterem registros precisos de suas transações e a estabelecer um sistema adequado de controles internos.
Nos anos 80 e início dos anos 90 diversos acontecimentos promoveram a criação e intensificação de regras de controle e integridade, especiamente no âmbito das instituições financeiras, merecendo destaque o Primeiro Acordo de Capital da Basiléia (1988).
Em 1997 houve a divulgação, pelo Comitê da Basiléia dos 25 princípios para uma Supervisão Bancária efiza, com destaque para o seu princípio número 14, tratava da necessidade de existência de controles internos adequados, que previa, dentro outras regras, a necessidade de auditoria interna e externa e de compliance para atestar adesão aos controles, leis e regulamentos aplicáveis.
Já no Brasil, desde 1998, com a publicação da Resolução 2.554 do Banco Central do Brasil (Bacen) foram incorporadas as regras do Comitê da Basiléia e dos Estados Unidos.
No entanto, foi a Lei 9.613/98 conhecida como a Lei de Combate aos Crimes de Lavagem de Dinheiro, a legislação com maior impacto no sistema de compliance. Além da forte regulamentação penal e processual penal, a nova lei cuidou de criar o Conselho de Atividades Financeiras – COAF, órgão da administração pública federal, n
a nova lei cuidou de criar entre nós o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – órgão da administração pública federal, no âmbito do Ministério da Fazenda, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas.
Dispõe sobre os crimes de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores; a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos nesta Lei; cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, e dá outras providências.
Além da sua importância penal, a nova lei cuidou de criar entre nós o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – órgão da administração pública federal, no âmbito do Ministério da Fazenda, com a finalidade de disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas.
Na Lei no 9.613/98 e nos princípios do Comitê da Basiléia podemos encontrar, portanto, a gênese da Resolução no 2.554/98, que obrigou os bancos brasileiros a criar estruturas e mecanismos efetivos de controles internos e de riscos.
Como o compliance ajuda as empresas a criar um ambiente corporativo transparente?
A reputação de uma empresa é um dos elementos mais relevantes para se manter forte no mercado. Por isso, os empreendimentos precisam se preocupar com a imagem que transmitem ao mercado, prezando sempre pelo que é correto, ético e honesto.
Como dito, em razão dos fortes abalos causados pelos escândalos de corrupção envolvendo empresas públicas, privadas e os governantes, hoje passamos por uma grave crise ética no nosso país. Todo esse cenário deixa claro o quanto a imagem de um negócio pode ser negativamente afetada caso se envolva em ações imorais e ilícitas, sejam elas fiscais, ambientais, sociais, trabalhistas e, especialmente, criminais.
Implementar o compliance à rotina empresarial, nesse contexto, vai muito além da manutenção de uma boa imagem e reputação do negócio, já que os benefícios ultrapassam esses aspectos. Atuar de forma regular, alinhada às normas e aos princípios éticos é imprescindível para se manter competitivo no mercado.
Um programa de compliance tem muito a acrescentar no dia a dia empresarial. Pode-se criar um ambiente corporativo mais transparente a partir dos seguintes benefícios:
- redução de erros, fraudes e crimes financeiros;
- reforço da credibilidade no mercado;
- fortalecimento de uma cultura organizacional mais íntegra;
- aumento na qualidade do produto e serviço;
- melhoria da produtividade da empresa;
- relações comerciais mais éticas e vantajosas;
- mais respeito e confiança de fornecedores, parceiros e investidores;
- melhoria no relacionamento com os clientes;
- redução de riscos de processos administrativos e criminais;
- mais apoio do poder público.
Por fim, saber o que é compliance é o primeiro passo para melhorar o desempenho de um negócio. Como vimos, esse conceito está em evidência e é um dos grandes diferenciais para se garantir uma atuação empresarial reta, ética e com mais possibilidades de sucesso.